Começo esta carta com o mesmo trecho que mandou de “Sound of Silence:-
“Olá escuridão, minha velha amiga
Eu vim para conversar com você novamente
Por causa de uma visão que se aproxima suavemente
Deixou suas sementes enquanto eu estava dormindo
E a visão que foi plantada em minha mente
Ainda permanece
Dentro do som do silêncio"
É
assim que me sinto hoje e como você sentiu quando te contei.
Lá
fora os ventos fustigam as janelas e a chuva cai torrencialmente aqui em
Curitiba.
Deve
ser o mundo acabando porque eu acabei com uma amizade pura de anos. Desculpe se
estou sendo dramática e fazendo-me de vítima. Meu sofrimento está cima do meu
pudor.
Ultimamente
também fico à meia luz, sentada na poltrona velha, ouvindo apenas o tic-tac do
relógio velho, morando na casa velha, onde tudo é velho, inclusive os meus
sentimentos.
Nisto
tudo, tem um lado que me consola porque sinto que o Pedro está animado com o
tratamento, embora este mesmo tratamento leve toda a dignidade da pessoa até
ela melhorar completamente. Mas ele é jovem, forte e tudo vai ficar bem.
Sara,
quando vou poder caminhar o caminho da nossa amizade novamente?
Quando
vou poder caminhar o caminho do seu coração? Do seu perdão?
Eu
sou sua amiga. Mas fui a maior traidora daqueles dias lindos de amizade pura
que tivemos com nossas famílias. Você e
Olívio era a minha família! Vou morrer e esta culpa vai me acompanhar. A única
esperança que tenho é se pudermos um dia sentar frente a frente e conversamos
sobre tudo. Eu não tenho explicações para
o que aconteceu, mas quero explicar!
Só
sei que somos ligados agora mais que antes. A Maria Cecília me ronda querendo
saber o motivo da minha inanição quando não estou com o Pedro. Devo contar a
ela? Não sei. Eu a fiz vir aqui para dar a sua porção de amor que um filho
precisa quando está doente. Ela mais vai ao shopping do que fica com ele. Mas
está aqui.
Lisa
vai chegar amanhã. Lembra-se dela? Aquela namorada- amiga do Pedro, a qual ele
nunca assumiu nem prá si próprio que ama. Pedro está eufórico e sinto que
quando ela chegar, o Kiko vai poder voltar para ficar contigo.
Repito,
não quero ser vítima. Mas a velhice me permite implorar. Eu imploro! Dê-me uma
chance de revê-la e tentar curar esta ferida que se abriu no meu peito e que
sempre doeu desde que a Maria Cecília nasceu.
Eu pensei em morrer com este segredo. Porque
não mudaria quase nada para ninguém. Mas com certeza o meu inconsciente queria
te contar. Só não sei se conseguirei viver o com julgamento de todos. Mas acredito que os percalços desta vida
devam ser revelados e relevados se for o caso.
Se não for o nosso caso, tenha
sempre em seu coração que eu sou sua amiga até o infinito.
Para sempre,
Clara
Clara
(TODOS OS DIREITOS RESERVADOS) publicação seg/quarta e domingo.
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