segunda-feira, 20 de junho de 2016

QUERIDA CLARA, (3a. Carta - O SEGREDO)

Espero que esteja bem e animada como aparenta na sua carta.
Quando o carteiro passou, corri para o quarto para poder ler e receber este alento de amizade que você sempre transmite. 


Clara, fiquei pensando no que disse sobre o comportamento do Pedro. Olha, com certeza são as preocupações da vida adulta. Lembro-me dele quando criança. Era um garoto divertido e muito carinhoso. 

Também me lembro dele correndo entre os nossos quintais e de entrar na minha casa como se fosse sua. Sorrir encostado na porta, enquanto eu terminava meus bolinhos de chuva. Era como um neto querido.  Viver requer paciência. Paciência com as adversidades.  E elas são muitas.  Não desista dele. Devagar vai descobrir o que se passa.
Não fique tão curiosa com o segredo... mas eu te agucei , então vou contar. 
Sentada na minha escrivaninha outro dia, enquanto lia os jornais, de repente tive a impressão nítida que alguém me observava de fora. Foi aí que levantei
os olhos e vi o Olívio caminhando pelo jardim. Tenho certeza Clara! Absoluta! Só que ele não estava velho como quando morreu. Era jovem como quando nos casamos. Ele caminhava devagar com as mãos entrelaçadas nas costas e sorria para mim.
Fiquei parada pensando que estava louca. Meu coração batia descompassado e eu não conseguia mover. Fechei os olhos, pensando que era uma alucinação, que quando abrisse, ele não estaria lá mais. Mas assim que abri os olhos, ele continuava lá Clara! Agora havia se encostado à paineira velha  e me olhava com olhos divertidos de quando me pregava uma daquelas peças. 
Ficamos assim em silêncio nos olhando. Eu uma velha caquética e ele, o jovem engenheiro que conheci na juventude e que me arrebatou o coração.
Resolvi sair para encontrá-lo então, já que continuava ali. Assim, que coloquei os jornais na escrivaninha e me levantei, um segundo, ele havia desaparecido.
Clara, será que estou ficando louca? Será que a demência, o tal de Alzheimer, ou o” diabo a quatro” que a modernidade inventou?
Não posso contar a ninguém, pois ultimamente todos andam cheios de dedos comigo e ao menor esquecimento, me tratam como uma louça prestes a quebrar! Ou como uma louca , né?!
Passou se um mês que eu o vi ali encostado na paineira.
Próximo ao aniversário dele, de repente eu o vi do outro lado da calçada. Ele trajava o mesmo terno do nosso casamento e tinha a mesma flor na lapela.
Agora estou todos os dias a olhar pela janela e tenho até acordado a noite para ver se o vejo novamente. Nunca mais apareceu. Tem mais de 30 dias. 
Estou louca Clara? Mande-me sua opinião.

Um beijo e um abraço de horas,

Sara.
PS.  Neste momento, continuo aqui na escrivaninha esperando...
*(TEXTO REGISTRADO PORTAL DIREITOS AUTORAIS)

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